A mulher do vizinho
Contaram-me que na rua
onde mora (ou morava) um conhecido e antipático general de nosso Exército
morava (ou mora) também um sueco cujos filhos passavam o dia jogando futebol
com bola de meia. Ora, às vezes acontecia cair a bola no carro do general e um
dia o general acabou perdendo a paciência, pediu ao delegado do bairro para dar
um jeito nos filhos do sueco.
O delegado resolveu passar uma chamada no homem, e intimou-o a comparecer à delegacia.
O sueco era tímido, meio descuidado no vestir e pelo aspecto não parecia ser um importante industrial, dono de grande fábrica de papel (ou coisa parecida), que realmente ele era. Obedecendo a ordem recebida, compareceu em companhia da mulher à delegacia e ouviu calado tudo o que o delegado tinha a dizer-lhe. O delegado tinha a dizer-lhe o seguinte:
— O senhor pensa que só porque o deixaram morar neste país pode logo ir fazendo o que quer? Nunca ouviu falar numa coisa chamada AUTORIDADES CONSTITUÍDAS? Não sabe que tem de conhecer as leis do país? Não sabe que existe uma coisa chamada EXÉRCITO BRASILEIRO que o senhor tem de respeitar? Que negócio é este? Então é ir chegando assim sem mais nem menos e fazendo o que bem entende, como se isso aqui fosse casa da sogra? Eu ensino o senhor a cumprir a lei, ali no duro: duralex! Seus filhos são uns moleques e outra vez que eu souber que andaram incomodando o general, vai tudo em cana. Morou? Sei como tratar gringos feito o senhor.
Tudo isso com voz pausada, reclinado para trás, sob o olhar de aprovação do escrivão a um canto. O sueco pediu (com delicadeza) licença para se retirar. Foi então que a mulher do sueco interveio:
— Era tudo que o senhor tinha a dizer a meu marido?
O delegado apenas olhou-a espantado com o atrevimento.
— Pois então fique sabendo que eu também sei tratar tipos como o senhor. Meu marido não e gringo nem meus filhos são moleques. Se por acaso incomodaram o general ele que viesse falar comigo, pois o senhor também está nos incomodando. E fique sabendo que sou brasileira, sou prima de um major do Exército, sobrinha de um coronel, E FILHA DE UM GENERAL! Morou?
Estarrecido, o delegado só teve forças para engolir em seco e balbuciar humildemente:
— Da ativa, minha senhora?
E ante a confirmação, voltou-se para o escrivão, erguendo os braços desalentado:
— Da ativa, Motinha! Sai dessa...
O delegado resolveu passar uma chamada no homem, e intimou-o a comparecer à delegacia.
O sueco era tímido, meio descuidado no vestir e pelo aspecto não parecia ser um importante industrial, dono de grande fábrica de papel (ou coisa parecida), que realmente ele era. Obedecendo a ordem recebida, compareceu em companhia da mulher à delegacia e ouviu calado tudo o que o delegado tinha a dizer-lhe. O delegado tinha a dizer-lhe o seguinte:
— O senhor pensa que só porque o deixaram morar neste país pode logo ir fazendo o que quer? Nunca ouviu falar numa coisa chamada AUTORIDADES CONSTITUÍDAS? Não sabe que tem de conhecer as leis do país? Não sabe que existe uma coisa chamada EXÉRCITO BRASILEIRO que o senhor tem de respeitar? Que negócio é este? Então é ir chegando assim sem mais nem menos e fazendo o que bem entende, como se isso aqui fosse casa da sogra? Eu ensino o senhor a cumprir a lei, ali no duro: duralex! Seus filhos são uns moleques e outra vez que eu souber que andaram incomodando o general, vai tudo em cana. Morou? Sei como tratar gringos feito o senhor.
Tudo isso com voz pausada, reclinado para trás, sob o olhar de aprovação do escrivão a um canto. O sueco pediu (com delicadeza) licença para se retirar. Foi então que a mulher do sueco interveio:
— Era tudo que o senhor tinha a dizer a meu marido?
O delegado apenas olhou-a espantado com o atrevimento.
— Pois então fique sabendo que eu também sei tratar tipos como o senhor. Meu marido não e gringo nem meus filhos são moleques. Se por acaso incomodaram o general ele que viesse falar comigo, pois o senhor também está nos incomodando. E fique sabendo que sou brasileira, sou prima de um major do Exército, sobrinha de um coronel, E FILHA DE UM GENERAL! Morou?
Estarrecido, o delegado só teve forças para engolir em seco e balbuciar humildemente:
— Da ativa, minha senhora?
E ante a confirmação, voltou-se para o escrivão, erguendo os braços desalentado:
— Da ativa, Motinha! Sai dessa...
Fernando
Sabino
COMPREENSÃO E INTERPRETAÇÃO DE TEXTO
01. De acordo com o
texto, o que gerou a situação conflituosa do texto?
02. No primeiro parágrafo
do texto, o narrador usa alguns recursos que o eximem da veracidade dos fatos
narrados. Observe o trecho inicial do conto:
“Contaram-me que na rua onde mora (ou
morava) um conhecido e antipático general de nosso Exército morava (ou mora)
também um sueco cujos filhos passavam o dia jogando futebol com bola de meia.”
a) Que pessoa do
discurso indica o pronome me
em destaque?
b) Por que
da expressão “contaram-me”, o leitor
é capaz de identificar com precisão a origem da história? Explique.
c) O conto “A mulher do vizinho” é
narrada em 1ª ou 3ª pessoa?
d) Qual seria a diferença de
sentido, se o trecho inicial do conto tivesse sido iniciado desta forma?
Na rua
onde mora (ou morava) um conhecido e antipático general do nosso exército morava
(ou mora) também um sueco cujos filhos passavam o dia jogando futebol com bola
de meia.
e)
Por que
podemos afirmar que o uso da 1ª pessoa pelo narrador, no início do conto, é
um recurso para se descomprometer da
veracidade dos fatos?
03.
Qual
é o assunto tratado nesse texto?
04. Em que momento da
narrativa se dá o clímax da história?
05.
Que
tipo de discurso foi usado nesse conto: direto ou indireto?
06. Com que objetivo foi
escrito esse conto?
07.
Algumas
expressões presentes no conto não fazem parte do vocabulário cotidiano de
grande parte das pessoas; no entanto, analisando o contexto, é possível
identificar a ideia que cada uma sugere. Então, escreva o que significam, nesse
contexto, as seguintes expressões:
a) Passar uma chamada: b) Casa da sogra:
c) Ir em cana: d) Morou?
08. Faça o resumo do
texto, retirando de cada parágrafo sua ideia principal.
RESPOSTAS
01. Os filhos do sueco jogando futebol com bola de meia, e às vezes a
bola caía no carro do
general.
02. a) 1ª pessoa.
b)
. Porque percebe-se que a
história foi contada por outra pessoa.
c) 3ª
pessoa.
d) Nesse caso o narrador conhece a história da qual
conta.
e) Ao fato
dele atribuir na história que contaram para ele, nesse caso ele se
descompromete totalmente do assunto contado.
03. O espanto do delegado ao conhecer a mulher do vizinho.
04. 8º e 9º parágrafo.
05. Indireto.
06. Para
mostrar que se deve conhecer as pessoas antes de falarem alguma a seu respeito
ou intimá-la para uma eventual situação.
07. a) convocar. b) fazer o que bem quiser. c) preso. d) Sacou, agora?
08. O autor no primeiro parágrafo se descompromete da veracidade dos fatos
narrados. E ainda ocorre a situação conflituosa do texto. O sueco e a mulher
comparece à delegacia, obedecendo a convocação do delegado. Este repreende o
sueco pela má disciplina dos filhos. A mulher do sueco apresenta uma
descompostura para com o delegado. Este desalentado ficou sem palavras ao
conhecer que aquela mulher era peixe grande.
E deu o caso por encerrado.